quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

"Eu não estive na prisão, eu vivi na prisão", relata Gilney Viana à CMV-JF

As experiências na Penitenciária de Linhares no período da ditadura militar foram o alvo das declarações de Gilney Viana à Comissão Municipal da Verdade de Juiz de Fora (CMV-JF). Gilney, que atualmente vive em Brasilia e foi coordenador do projeto "Direito à Memória e à Verdade" da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, veio a Juiz de Fora nesta quarta-feira (28) prestar depoimento à CMV-JF e contribuir com as pesquisas do colegiado. Ele iniciou seu envolvimento com o movimento de esquerda após se aproximar de um amigo que lia jornais e livros de reflexão comunista. A partir daí, começou a participar de reuniões do PCB e atuar em grupos de guerrilha urbana.

Como ativista, rompeu com a tendência de políticos conservadores da família, participando de movimentos de esquerda. Mas, apesar de toda a agitação política da esquerda naquela época, disse que foi um choque quando o golpe de 1964 se instaurou, pois ninguém do partido esperava. “Há quem diga que o golpe teve o seu sucesso porque a esquerda não tinha uma visão de resistência a ele", provocou Gilney, que discorda dessa versão.

Como guerrilheiro, assaltou bancos e roubou carros. Foi detido em várias prisões, entre elas a penitenciária de Ribeirão das Neves, Ilha Grande, Doi-Coidi no Rio de Janeiro e também na penitenciária de Linhares. Após a última prisão, em 1970, cumpriu pena por cerca de dez anos, quando ficou detido no Rio de Janeiro e depois foi trazido para Juiz de Fora. Quando chegou aqui, ficou sete dias no Quartel General, no Bairro Mariano Procópio, onde foi interrogado e depois levado para Linhares. Gilney relembrou que juntamente com ele, cerca de 80 presos, entre homens e mulheres, constituíam a população carcerária. Apesar de não ter sido torturado fisicamente em Juiz de Fora, relatou constrangimentos e pressão psicológica, além de casos de agressões de colegas. No Rio de Janeiro sim ele disse ter sido duramente torturado, quando em uma ocasião passou por uma noite inteira de agressões.

Durante o período que esteve em Linhares, por muito tempo, não pôde ter contato com a família, e dentro das celas também havia fiscalização pelos militares. Era uma particularidade de Linhares ser vigiado por 24 horas e não poder ter cortinas nas celas. "Eu não estive na prisão, eu vivi na prisão. Eu militei, escrevi,estudei e casei em Linhares. Fiz do limão uma limonada", afirma Gilney ao relatar sobre o período que esteve preso na cidade. Havia articulação dos militantes dentro da penitenciária, montavam coletivos para poder argumentar com a administração carcerária. Eram orientados pelas respectivas organizações, para que todos fizessem denúncias sobre torturas. Ao todo, Gilney Viana permaneceu em Linhares por sete anos e três meses. Depois foi transferido para a penitenciária Milton Dias Moreira, no Rio de Janeiro, onde ficou detido por mais dois anos e sete meses. Atualmente, Gilney reside em Brasília, é membro da Comissão Camponesa da Verdade e atua em outras frentes de defesa dos direitos humanos.

sábado, 24 de janeiro de 2015

Paulo Cesar diz que, quando censurada, rádio repassava informação ao impresso

Apesar de ainda ser um menino quando o golpe de 1964 foi deflagrado, o editor-geral do jornal Tribuna de Minas, Paulo César Magella, traz lembranças vívidas da ditadura militar, e principalmente dos anos finais do regime, quando já atuava como jornalista em Juiz de Fora. Com uma memória invejável, o jornalista se recordou em entrevista à Comissão Municipal da Verdade de Juiz de Fora na última terça-feira (20) que muitas vezes eram os censores que levavam a notícia às redações. Segundo ele, em algumas ocasiões os avisos das informações que não poderiam ser publicadas pela Rádio PRB3, onde atuava, acabavam informando os jornalistas do que ocorria. “Sem querer eles nos avisavam de coisas que não sabíamos. E aí, como o aviso de censura tinha chegado só para a gente, passávamos a notícia para os jornais do grupo (Diários Associados) e eles publicavam.” PC, como é mais conhecido, lembra que essa era uma das poucas maneiras de driblar a censura e veio a ocorrer em um momento de repressão menos intensa.

Contudo, na maioria dos casos, as imposições do regime autoritário acabavam sendo aceitas nas
"Fazíamos vigília na Auditoria Militar para cobrir
o caso dos 18"
redações. “Um censor aparecia com uma nota dizendo que determinada matéria não poderia ser publicada”, e os editores, cautelosos com as publicações, seguiam as orientações com o intuito de evitar represálias.

Entre as coberturas que participou durante o período da ditadura, PC se recorda das visitas de políticos a Juiz de Fora. “Foi a primeira vez que vi um presidente da República de perto”, diz ao falar da passagem do general Ernesto Geisel pela cidade. Outro momento marcante foi entrevistar Leonel Brizola no início dos anos 1980: “Era cativante ouvir Leonel”.

Outro caso destacado pelo jornalista diz respeito a um processo envolvendo colegas de profissão. “Fazíamos vigília na Auditoria Militar para cobrir o caso dos 18.”. A menção diz respeito à cobertura feita pela imprensa sobre o processo instaurado pela Justiça Militar em 1981, que ficou conhecido como “Julgamento dos 18”. Na ocasião, foram julgadas 18 pessoas, inclusive três jornalistas, entre eles Renato Henrique Dias, por noticiarem um manifesto de sindicatos e movimentos estudantis que denunciava suspeitas de fraude na acusação de um professor pela Lei de Segurança Nacional. Antes disso, conforme PC, a cobertura dos processos julgados em Juiz de Fora era bem menos destacada nos veículos de comunicação, já que havia dificuldade de acesso à Auditoria e aos processos.

Nascido na cidade de Santos Dumont em 1953, o jornalista lembra do medo que sentiu no dia 31 de março de 1964: “A movimentação era grande, os vizinhos saiam de casa para servir ao Exército.” A notícia foi recebida pela família através do rádio e, seu pai, que era ferroviário - filiado ao PTB e fazia parte de movimentos políticos, logo tratou de contar ao filho que o presidente havia sido deposto por militares. Apesar do conhecimento político e envolvimento partidário do pai, PC diz que ele não sofreu represálias durante o período ditatorial.

Apesar de ainda não entenderem a dimensão do que ocorria no país, PC diz que ele e os colegas se manifestavam como podiam. Ainda no colégio, protestavam “colocando as cadeiras uma em cima da outra na sala de aula.”
Seu primeiro contato com o jornalismo foi aos 17 anos, na Rádio Cultura de Santos Dumont, quando havia acabado de se formar em contabilidade. Depois, enquanto estudante de direito na UFJF, em dezembro de 1975, começou a trabalhar no quadro dos Diários Associados. Seu primeiro trabalho de destaque foi uma manchete na edição de domingo do Diário Mercantil. A reportagem era sobre um discurso feito em Juiz de Fora pelo advogado, jurista e escritor Heleno Cláudio Fragoso. “Devo a ele e ao Wilson Cid (jornalista) o meu ingresso no jornalismo.”



“Fui segurado pelas calças”, relata Toninho Carvalho

Os constrangimentos enfrentados pelos jornalistas durante a ditadura militar integram as lembranças de Antônio Geraldo Carvalho, o Toninho Carvalho, Bem humorado, o fotógrafo contou à Comissão Municipal da Verdade (CMV-JF), na manhã da última terça-feira (20), sobre o dia em que foi retirado de um restaurante segurado pelas calças por militares. Ele tentava fotografar o então presidente da República, Arthur da Costa e Silva: “Fiquei com os pés suspensos no elevador. Fui segurado pelas calças.”

Toninho iniciou sua carreira no jornalismo como revisor da Gazeta Comercial, em 1964. No fim dos anos 1960 foi para o Diário Mercantil, já como fotógrafo. Fotografou julgamentos de presos políticos na Auditoria Militar, que funcionava na Praça Antônio Carlos, e entrevistas na Penitenciária de Linhares. Normalmente, era necessária autorização do oficial de Justiça, do juiz ou do promotor Simeão de Faria, para realizar fotos na Auditoria. Algumas vezes, Toninho foi impedido de fotografar e, para escapar da prisão, ia embora sem as imagens. Em outras situações, fotografou escondido, sem usar o flash.

“Os militares censuravam tudo, inclusive as fotografias.” Na visão dele, os fotógrafos eram os mais prejudicados. “Nós erámos ‘pau-mandados’.” Censores entravam nas redações e os negativos eram levados para avaliação antes da publicação das fotos. Apenas aquelas fotografias que eram aceitos pelos militares, voltavam à redação, o resto do filme era cortado e ficava com o Exército.
Para Toninho, os fotógrafos eram os mais prejudicados
na ditadura

No dia 31 de março de 1964 Toninho recorda da partida das tropas em direção ao Rio de Janeiro para derrubar o presidente João Goulart. “As mulheres jogavam flores. Acreditavam nas vantagens da revolução.” Conforme o fotógrafo, um ano após o golpe, ainda havia comemoração na cidade e ele não compreendia como as pessoas poderiam celebrar o que estava ocorrendo: “Havia faixas pelas ruas de Juiz de Fora com os dizeres ‘Viva a Revolução!’”


No início da década de 1980, quando a “repressão já era mais branda”, o movimento estudantil de Juiz de Fora, liderado pelo Diretório Central dos Estudantes, organizou uma manifestação pela melhoria do transporte público. Na ocasião, Toninho refugiou-se em um prédio para fotografar a manifestação, já que os militares não permitiam fotografias: “Eles estavam tomando as máquinas dos fotógrafos e quebrando.”

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

“Havia pessoas infiltradas como informantes”


O segundo entrevistado do dia 13, foi o jornalista Jorge Sanglard. Nascido em 1954, iniciou seus estudos na UFJF em 1976. Sanglard recordou do seu primeiro dia de aula como estudante de comunicação, quando o também estudante Xico Teixeira perguntou a ele e seus colegas se tinham interesse de participarem do movimento estudantil da universidade. Na época da ditadura, praticamente não havia estrutura democrática na instituição, como lembrou o jornalista, que diz ter aceitado o convite.

Sanglard participava dos eventos políticos relacionados à faculdade e distribua folhetos poéticos sem qualquer relação com a ditadura, mas que de alguma forma eram vistos como afronta. Por isso, o jornalista afirmou que ele e seu grupo de amigos, muitos militantes de esquerda, eram perseguidos pelos militares. O jornalista disse que a desconfiança dos integrantes do movimento estudantil era de haver pessoas infiltradas como informantes nas salas de aula. “Tinha aluno na universidade que frequentou uns seis cursos. Tudo indica que poderia ser informante ou policial infiltrado.” Algumas vezes, os alunos encontraram policiais na porta do Diretório Central dos Estudantes (DCE) e, em uma ocasião, o então presidente do órgão estudantil Carlos Alberto Pavam chegou a ser retirado por policiais de dentro do carro do então senador Itamar Franco. “O Itamar teve que intervir em Brasília para soltarem o Pavam.” Nesse momento, perceberam que a repressão contra os estudantes da universidade ainda era forte, o que culminou na prisão de alguns colegas como Mirian Delgado e Sandra Cheker.

Mas os estudantes não pareciam se intimidar, pois, conforme Sanglard, como forma de protesto à violência contra jornalistas, nomearam o Diretório Acadêmico da Faculdade de Comunicação de Wladimir Herzog, jornalista torturado até a morte durante a ditadura.

As primeiras manifestações em busca da democratização da universidade aconteceram no final dos anos 1970, período de início do processo de abertura política. Uma delas, a maior manifestação até então, promovida pela melhoria no transporte público e consequentemente do acesso à UFJF, ocorreu no Parque Halfeld, em frente à antiga Prefeitura (atual Funalfa). Com medo de que o prédio fosse invadido, o prefeito Mello Reis pediu ajuda policial. O que ninguém esperava é que os policiais chegariam com cavalaria e cachorros, que atacaram os manifestantes. Muitas pessoas foram feridas e vários estudantes detidos. “A cidade foi atacada e foi a primeira vez que a tomou um posicionamento claro contra a repressão”, afirmou Sanglard. Isso porque depois da forte repressão aos manifestantes, os jornais e a sociedade passaram a cobrar postura menos truculenta das autoridades. Em outra manifestação, por melhorias no Restaurante Universitário, vários outros alunos foram detidos após tomarem a cozinha da unidade.


Em 1981, após atuar em alguns jornais alternativos (como Poesia, Bar Brazil, D’Lira, Abre Alas e Em Tempo), foi contratado como diagramador da Tribuna de Minas, que acabara de ser fundada. Sanglard afirmou que nesse momento já não havia mais repressão dentro das redações e que os veículos tinham mais liberdade em suas publicações. “Nessa época eu nunca presenciei uma situação de censura dentro do jornal”. 

Jorge Sanglard tinha forte atuação nos movimentos
estudantis na época da ditadura

Jornalista chegou a ser processado por ter publicado manifesto

Na manhã da último dia 13, a Comissão Municipal da Verdade entrevistou dois importantes jornalistas de Juiz de Fora. O primeiro entrevistado foi Renato Henrique Dias. Nascido em Juiz de Fora em 1949, tinha apenas 15 anos quando foi deflagrado o golpe militar no país em 1964. Com a impossibilidade de ter acesso à informação por questões financeiras, por não ter aparelho de rádio em casa nem como comprar jornais, Renato não tinha consciência do que de fato acontecia no país: “Apesar de estar ciente de que algo não estava bom no governo de João Goulart, não sabia que o golpe havia saído de Juiz de Fora.” Mesmo servindo ao Exército em 1968, o jornalista só compreendeu a situação do país quando começou a trabalhar no escritório da Livraria Exata, onde começou a ler artigos e ter acesso a periódicos como O Pasquim e Jornal do Brasil. A partir daí tomou consciência de que estava vivendo sob forte repressão.
Renato Henrique Dias foi julgado e absolvido
no "Julgamento dos 18"

Começou a estudar jornalismo na UFJF no início da década de 1970 e diz que o jornalista José Carlos de Lery Guimarães foi sua maior inspiração ao escolher o curso. Na faculdade, acompanhava os movimentos estudantis, mas não teve participação efetiva em diretórios acadêmicos ou partidos políticos. Iniciou seu trabalho na imprensa como estagiário na editoria policial do Diário da Tarde, impresso do grupo Diários Associados, no final dos anos 1970. Em uma manifestação para a melhoria do transporte público, Renato foi mordido por um cachorro da polícia que chegou também com a cavalaria para conter os manifestantes.

Nesse momento, os jornais já tinham mais liberdade em suas publicações, inclusive as prisões eram noticiadas. Mas haviam resquícios da mão do poder na redação e algumas reportagens eram “adiadas” pelos próprios editores. Seu grande contato com a ditadura foi em um processo que sofreu como editor de cidade por publicar uma matéria sobre o manifesto de sindicatos e movimentos estudantis que denunciava suspeitas de fraude na acusação de um professor pela Lei de Segurança Nacional. Renato diz que os jornalistas foram incluídos no processo porque estariam “desmoralizando a Justiça Militar ao publicar esse tipo de denúncia”. Ele, o editor-chefe e a repórter que apurou a matéria, além de outras 15 pessoas direta ou indiretamente envolvidas com a elaboração do manifesto, foram a julgamento em novembro de 1981, no que ficou conhecido como “Julgamento dos 18”. Ao final, todos foram absolvidos.

O jornalista tem poucas recordações do movimento pró-anistia apesar de ter sido muito forte e com enorme espaço de divulgação nos jornais. Para ele, o seu papel no período da ditadura era como o de um historiador: “A minha intenção era ser um instrumento de divulgação dos fatos, para estarem documentados os acontecimentos do período.”

Renato lembrou de como Juiz de Fora era uma cidade conservadora, o que refletia no conservadorismo dos próprios jornais e ressaltou a diferença entre o jornalismo praticado naquela época e o de hoje: “A mídia fazia a cabeça das pessoas. Hoje a força popular é muito maior e ela manipula a cabeça da mídia.”


sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Obregon diz que promotor da Justiça Militar atendia interesses da ditadura

Obregon Gonçalves ladeado por Cristina Guerra e Helena da Motta
“Aqui não se fazia Justiça, ratificava-se o interesse da Revolução.” Foi assim que o advogado Obregon Gonçalves definiu a atuação da Auditoria Militar da 4ª Região no período da ditadura militar. E os bastidores da Auditoria foram justamente o foco do depoimento do advogado na tarde desta sexta-feira (16). Mineiro de Belo Horizonte, o jurista veio a Juiz de Fora com o apoio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para contar à Comissão Municipal da Verdade (CMV-JF) relatos sobre o período autoritário, quando ele defendeu centenas presos políticos.  De acordo com ele, que é ex-vereador da capital mineira e autor de livros, a Auditoria era um lugar temido, já que nem sempre se acreditava que ali se faria justiça.
A relação de Obregon com a Auditoria de Juiz de Fora nos anos de repressão começou logo depois do golpe de 1964, quando ele atuou no processo dos deputados estudais Sinval de Oliveira Bambirra, José Gomes Pimenta (o Dazinho) e Clodesmidt Riani. Obregon era advogado de Sinval. “O clima na cidade era hostil e de insegurança, até mesmo para os advogados.”
“Na Auditoria Militar, havia uma pessoa que mandava, o Simeão de Faria”, destacou Obregon, que fez questão de frisar o caráter impolular do promotor perante os advogados, por conta da rigidez nos processos. “O Simeão era um cidadão de pouca cultura jurídica e tinha medo de enfrentar os advogados. Mas ele mandava.”
Segundo Obregon, o juiz Waldemar Lucas Rego de Carvalho, mais conhecido como “jacaré engomado”, costumava seguir as orientações de Simeão de Faria, o que parou de ocorrer quando Antonio de Arruda Marques assumiu o posto de juiz-auditor. “O Arruda não acatava o Simeão.” E Obregon atribui a isso a cassação e afastamento precoce deste juiz da Auditoria. “Quando vi pela televisão, pensei: mataram o homem.” Arruda não tinha morrido, mas foi afastado e, de alguma forma, Obregon estava certo que o desgosto levaria o juiz Arruda a falecer.
O advogado contou também que chegou a ser intimado e acusado por desacato, por conta de um mal entendido, precisando explicar ao Conselho de Justiça os termos jurídicos que havia utilizado para se livrar do processo. “Havia um juiz civil e três militares, que não entendiam de direito.”
Como defensor de presos políticos, Obregon recebeu muitas ameaças. Entre os casos que recordou estão a ocasião em que, logo após chegar à sede da OAB em Belo Horizonte, foi chamado pelo motorista para avisá-lo que o carro da Caixa de Assistência dos Advogados – na qual era presidente – estava pegando fogo. “Alguém de táxi jogou uma bomba no carro, e não conseguiram identificar quem foi. Mas quem sofreu mais ameaças foi a minha mulher.” Segundo ele, a esposa recebia ligações do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) ameaçando a família. “Queriam me pressionar.”

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

“Ficamos inteiramente afastados da liberdade de comunicação”, comenta o jornalista Wilson Cid em entrevista à Comissão

No dia 8 de dezembro, a Comissão Municipal da Verdade ouviu o jornalista Wilson Cid. Aos 74 anos, Wilson contou sobre sua participação no jornalismo nas décadas de 60 e 70, e comentou como era a dinâmica da repressão no período da ditadura.
Jornalista Wilson Cid relembra sobre
a primeira prisão do golpe

No momento do golpe, Wilson era redator na Rádio Sociedade e também trabalhava no jornal Diário Mercantil. Ele contou que às vésperas da queda do presidente, a sensação de que algo estava para acontecer era presente nas redações. Havia uma enorme movimentação no aeroporto da Serrinha, com várias autoridades do estado e do país.

“O primeiro preso do golpe foi o Diretor Regional dos Correios”, lembrou. No dia 31 de março de 1964, o clima na redação foi relativamente normal até as 17 horas, mas, às 19, já havia uma censura nas emissoras de rádio para não transmitir a Voz do Brasil. No dia seguinte, às 9 horas, o programa da Rádio Sociedade já estava totalmente censurado.

De acordo com o jornalista, os donos dos jornais associados, Diário Mercantil e Diário da Tarde, se colocaram a favor do golpe militar. Por isso, sofreu com duas censuras: a militar e a da própria empresa onde trabalhava. Wilson recordou que a polícia chegava com um telegrama, que deveria ser assinado pelos responsáveis, informando a censura de determinadas reportagens. No lugar do texto censurado ficavam espaços em branco ou receitas culinárias.

Pela forte repressão da época, os jornalistas da cidade não tiveram oportunidade de cobrir as prisões e torturas feitas pelo regime militar: “Ficamos inteiramente afastados da liberdade de comunicação”. Para ele, a marca mais grave deixada pela ditadura foi o medo que o jornalista tem de assumir a informação, pelo receio de sofrer com represálias. “Isso é muito constrangedor para a profissão”, lamentou.


Wilson Cid não tinha grandes militâncias partidárias, apesar de ter participado por alguns meses do MDB, o atual PMDB. O jornalista afirmou que poucas pessoas filiaram-se ao partido na época, por medo da repressão.