quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Itamar David Bonfatti - 29/07/2014



Professor aposentado da UFJF fala sobre sua militância no Movimento Familiar Cristão e sua prisão durante o AI-5



“Queriam saber o que a igreja em Juiz de Fora pensava”- Itamar Bonfatti



No dia 29 de julho de 2014, o ex-preso político e professor aposentado da UFJF Itamar David Bonfatti falou à Comissão Municipal da Verdade sobre suas experiências durante o período ditatorial em Juiz de Fora, sobre presos políticos, militares e integrantes de movimentos clandestinos acolhidos em sua casa. Casado e pai, foi preso em 28 de janeiro de 1972 - período em que vigorava o AI 5, e libertado cerca de um mês depois. Ficou detido no presídio de Linhares e conta que não sofreu tortura física, mas que a tortura psicológica foi intensa. Nudez, humilhação, calúnias, injúrias e incertezas eram práticas comuns, utilizadas para intimidar, que fizeram parte dos dias de encarceramento vividos pelo professor.

Itamar afirmou que as prisões ocorriam preferencialmente nas sextas-feiras, à tardinha, possibilitando que os militares desaparecessem com a localização do preso. “Fiquei aliviado quando vi, pela beiradinha da caminhonete, que estava indo para Linhares. Sabia que se fosse levado para Belo Horizonte, seria torturado. Percebi que seria interrogado e conforme fossem as minhas respostas, ficaria em Linhares ou seria enviado a Belo Horizonte.”

     Itamar acredita que sua prisão foi motivada pela militância na igreja católica, dentro do Movimento Familiar Cristão - MFC e não pelo fato alegado pelos militares: um de seus alunos, que à época cursava medicina, pediu que ele guardasse em sua casa um pacote com panfletos do partido comunista, para que outra pessoa fosse pegar. Ele aceitou, mesmo sabendo do que se tratava. Pouco tempo depois, esse rapaz foi preso e torturado. Durante uma sessão de intensa tortura, contou sobre a ajuda do professor nessa empreitada. “Eles queriam um pretexto para minha prisão e tiveram o pretexto” declarou.

    Durante um dos interrogatórios, Itamar viu sobre uma mesa toda a documentação do Movimento Familiar Cristão. As perguntas feitas eram relacionadas à sua atuação na igreja e pouquíssimas ao fato ocorrido. “Sabiam que eu não participava de nenhum movimento clandestino ou partido político. Sabiam da minha militância. Percebi claramente que queriam saber o que de fato eu pensava, o que a igreja em Juiz de Fora pensava.” relatou.

    À época de sua prisão lecionava no Instituto de Ciências Biológicas (ICB) e na Faculdade de Serviço Social da UFJF, onde ministrava a disciplina “Doutrina Social da Igreja”, que apresentava conteúdo contrário às propostas do regime. Embora não fizesse parte de partidos políticos ou movimentos clandestinos, Itamar não restringia sua fala aos interesses do regime militar. “Eu militava dentro do ICB, aqui na universidade e tinha à minha disposição auditórios, laboratórios. Falava o que pensava, mesmo sabendo que entre os alunos haviam pessoas ligadas ao serviço de segurança, pois me sentia totalmente descomprometido com o movimento clandestino e com o partido político.”

Por conta de seu posicionamento religioso, acolhia pessoas que vinham a Juiz de Fora por diversos motivos. Recebia parentes de presos políticos e pessoas que participavam de movimentos clandestinos. Recordou que manteve uma pessoa escondida em sua casa, e que os militares posteriormente descobriram. Ao ser questionado sobre o que restou em sua vida, relativo aos acontecimentos durante o período ditatorial, Itamar concluiu: “Para mim valeu toda a prisão, pois o que vale é o testemunho da fé. As consequências ruins eram muito pequenas diante disso.”



                                                                                  
                                                                                  Fotos por: Jéssica Dias

Um comentário:

  1. Querido prof Itamar, exemplo de vida e compromisso com ela.Respeito e admiração sempre, após tantos anos! Pautei minha vida profissional em seus ensinamentos e na doutrina social da igreja. Valeu à pena. Grande abraço.

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